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Tuesday, July 3, 2012

GLOSSÁRIO: MÚSICA ERUDITA INOVADORA NO SÉCULO XX (Berlim, 1905-; Paris, 1909-; Nova York, 1950-; Rio de Janeiro, 1987-1988; Belo Horizonte, 1995).


GLOSSÁRIO: MÚSICA ERUDITA INOVADORA NO SÉCULO XX (Berlim, 1905-; Paris, 1909-; Nova York, 1950-; Rio de Janeiro, 1987-1988; Belo Horizonte, 1995).


Considerado como o último dos compositores românticos, Richard Strauss (Munique, Alemanha, 1864-1949), inovou na sua ópera Salomé (Opus 54; Berlim, 1905). Strauss, ao introduzir ruídos e dissonâncias na música, antecipou o atonalismo, presente na obra do pintor, músico e compositor austríaco, Arnold Shoenberg (Viena, 1874-1951), que inventou o dodecafonismo, quando abandonou o sistema de composição vigente há séculos na música erudita ocidental. 

Outro músico inovador, com forte veia crítica e cômica foi Erik Satie (Honfleur, Le Havre, França, 1866-1925). Satie compôs a música para o balé Parada [Parade], manifesto tri-dimensional Cubista de Jean Cocteau e Pablo Picasso, apresentado nos palcos parisienses pelos Ballets Russes (Paris, 1917). Satie compôs a música para sua peça teatral, A Estratégia de Méduse [Le piège de Méduse] dita, Comédia Lírica em um ato e nove cenas (1913), interrompida por sete danças de um macaco mecânico (M. Jonas). Esta obra, apesar de ser anterior ao movimento Dadaísta, certamente o antecipou; no espetáculo teatral, Satie procurou ilustrar a crítica da linguagem através do emprego de idioma estapafúrdio. O músico usou como temática do argumento, original e engraçado, o personagem Astolfo, empregado em divórcios e acidentes de trabalho, que desejava pedir ao Barão Méduse a mão de Frisette, sua filha, em casamento. Essa peça teatral, de uma comicidade fora do comum, foi apresentada no Teatro Michel (Paris, 24 maio, 1921). No mesmo ano Sergey Diaghilev organizou concerto em homenagem a E. Satie, realizado em Londres.
 
Satie escreveu quadro a quadro a música para o filme Entr'acte [Entreato] (1924), dirigido por René Clair, projetado no intervalo entre os dois atos do espetáculo de balé. Esta foi a primeira composição musical criada especialmente para o cinema das vanguardas parisienses, no filme que foi como brincadeira para grupo destacado de artistas, entre eles Marcel Duchamp, Man Ray e o bailarino e coreógrafo dos Ballets Suedois, Jean Borlin, entre outros.
  
Satie escreveu dissonâncias deliberadas no seu conjunto de peças para piano, que incluiu Fragmentos em forma de pera (1903); ele compôs a Missa dos Pobres (1895); o drama sinfônico Sócrates (1918), com vozes e a leitura, segundo uma recitação ideal, de um texto de Platão. Os músicos e pesquisadores Maria da Gloria Capanema Guerra e Paulo Barcelos levantaram todas as partituras compostas por Erik Satie para música de câmera, que divulgaram em um único concerto (Rio de Janeiro, 1987). 

Outra música para balé de E. Satie foi Relâche [Relache] (1924), composta para os Ballets Suedois [Balés Suecos], de Rolf de Maré, com libreto de Francis Picabia, autor do argumento do filme Entr'acte [Entreato] (1924), dirigido por René Clair, projetado no intervalo entre os dois atos do espetáculo de balé. Esta peça musical de E. Satie foi elevada à categoria de primeira peça Surrealista: o espetáculo encerrou a carreira de quatro anos dos Balés Suecos nos palcos parisienses (1920-1924). A obra, que estreou no Teatro dos Champs Elysèes (04 dez., 1924), foi levada aos palcos brasileiros., o balé em dois atos Relâche foi encenado com a Cia. de Dança e Orquestra Sinfônica de Minas Gerais, no Grande Teatro do Palácio das Artes (Belo Horizonte, 23-26 set., 1995). No espetáculo brasileiro a direção musical e a regência foram do maestro Roberto Duarte, a concepção e a coreografia de Tíndaro Silvano, a cenografia e os figurinos de Marco P. Rolla, o projeto de luz de Jorge Luiz, pintura de arte de Vânia Sales, a criação do vídeo de abertura foi de Marcos Barreto, a coordenação de cena de Raúl B. Machado e coordenação geral de Vera N. Campos e José Zuba Júnior. Para a Cia. de Dança de Minas Gerais, a direção foi de Patricia A. Zol e Tíndaro Silvano, com a Maîtresse de Ballet Bettina Bellomo e os assistentes ensaiadores Cristina Rangel, Lydia del Picchio e Cristina Pedroso, tendo como principais bailarinos convidados Fernando Cordeiro e Márcia Guerra, acompanhados de um corpo de baile com vinte e quatro bailarinos. A instalação do hall de entrada foi concepção de Tarcísio Ramos: a abertura apresentou composições para piano solo de Erik Satie, tocadas pelo pianista Eduardo Hazam e seguidas da apresentação de Relâche, Balé Instantâneo em dois atos e um entreato cinematográfico.
Igor Stravinsky (Lomonosov, Rússia, 1882-Estados Unidos, 1971), compôs e regeu até os oitenta e cinco anos de idade: é impossível descrever com justiça a sua extraordinária contribuição para a música erudita inovadora no século XX. Nas suas composições o músico revolucionou, dando destaque ao ritmo. A mais conhecida de suas obras é a música para o balé A Sagração da Primavera [Le Sacre du Primptemps], apresentado como Cenas da Rússia pagã em duas partes (1911-1913), dedicado a Nicolay Roerich (34´), encenado pelos Ballets Russes de S. P. Diaghilev (Paris, 1909-). A relação completa de todas as composições de Stravinsky se encontra publicada (THOMPSON, 1973). 
 
A música de Anton von Webern (Viena, 1883-1945), não ficou conhecida nem foi interpretada na sua época: ele viveu modestamente, primeiro perto de Viena em Mödling-bei-Wien (1918-1932) e depois em Maria Enzerdorf (1932-1945). As composições iniciais do músico receberam a influência de Brahms, Gustav Mahler e de seu mestre Arnold Schoenberg, mas logo ele descartou-as para desenvolver seu estilo bastante pessoal. No terceiro período de sua obra musical, Webern passou a desenvolver composições radicais: ele compôs a seguir obras minimalistas (1910-1914), baseadas nos poemas Hai-Kai japoneses, quando suas músicas se tornaram muito breves e quase inaudíveis, como no Quarteto de Cordas (Opus 13, 1905) composta com um movimento (15'), música apresentada na primeira récita com o Quarteto de Cordas da Universidade de Washinghton (26 maio, 1962); e os Cinco Lieder dedicados a Richard Dehmel, [Fünf Dehmel Lieder] (1906; pub. 1953, ed. Jacques Louis Monod). Durante os treze anos seguintes Webern compôs somente para voz, quando rompeu a estrutura tradicional do Lied, melodia cantada acompanhada por um instrumento, o piano, para compor obras nas quais, de acordo com a declaração de Pierre Boulez (DUFOURCQ, 1976), a voz organiza e supervisiona a distribuição dos conjuntos. Esta fase da obra de Webern, durou do Opus 13 ao 19 (inclusive). A música de Webern entrou em outra fase de depuração ascética (1924-1934), quando ele compôs Trio para Corda (Opus 20, 1927), obra apresentada no Festival ISCM (12 set., 1928), transmitida depois pelo rádio (15 out.) com membros do Quarteto de Cordas de Viena, trio para cordas com Rudolf Kolish, Eugen Lehner e Benar Heifetz, respectivamente violino, viola e violoncelo; Sinfonia (Opus 21), dedicada à sua filha Christine, obra que estreou na Liga de Compositores (Nova York, 8 dez.), com a regência do maestro Alexandre Smallens (1929); o Quarteto (Opus 22), para violino clarinete, tenor, saxofone e piano, dedicado ao arquiteto Adolf Loos, por ocasião de seu sexagésimo aniversário (1930); o Concerto Opus 24 para nove instrumentos, dedicado a Arnold Schoenberg no seu sexagésimo aniversário (1934), cuja estréia deu-se anos depois com o Conjunto de Câmera da Orquestra Nacional da França sob a regência de René Leibowitz (11 fev., 1947). O músico explorou ao máximo as idéias da Klangfarbenmelodie [melodia de timbres], revelada e parcialmente desenvolvida por seu mestre A. Schönberg, técnica segundo a qual as notas que constituem uma linha polifônica são atribuídas a diferentes instrumentos. Este método inovador de composição criou um dito, Ambiente Sonoro, permitindo à música atingir sua projeção espacial,  saindo do universo ambiental sonoro horizontal-vertical.

Quanto aos músicos do Futurismo italiano, Balila Pratella foi maestro; Luigi Russolo foi instrumentista, pintor e compositor; e outros, como Alfredo Casella e Franco Casavolla, foram compositores vanguardistas que se tornaram conhecidos e lançaram vários manifestos sobre a música e o ruído. 

As teorias libertárias do movimento do Estridentismo Mexicano (v.), influenciaram a obra músical de Silvestre Revueltas (1899-1940), sobre a qual SOTO (1999) declarou que, distante de ser compositor nacionalista esterotipado, Revueltas foi compositor Expressionista, com complexa e profunda visão da emoção humana. O músico se tornou conhecido do público através de  sentido altamente refinado de drama, contraste e movimento. Artistas da estatura de Edgar Varèse, Aaron Copland, Manuel Maria Ponce, Amadeo Roldán, Carlos Pellicer, Octávio Paz, Pablo Neruda, Rafael Alberti, Nicolás Guillén e Luis Cardoza y Aragón, admiravam-no (v. biografia).

No grupo de músicos experimentais norte-americanos que se destacou no começo do século, citamos Georges Antheil (Trenton, NJ, EUA, 1900-1959), pianista de origem polonesa que viveu na Europa. Antheil recebeu a bolsa Guggenheim Fellowship (1922-1923), quando viajou para Paris, onde entrou em contacto com vários artistas de vanguarda. O músico foi amigo de Salvador Dali, Man Ray, Joan Miró, André Breton e Louis Aragon, sendo que o último escreveu o libreto para a ópera Fausto III, obra inacabada de Antheil. O músico ilustrou musicalmente com 50 pequenos prelúdios a obra do Surrealista Max Ernst, Mulher 100 cabeças [Fêmme 100 Têtes], realizada na técnica de Colagem [Collage]. Esses prelúdios foram dançados, anos mais tarde, por Martha Graham. Para sobreviver, Antheil tocava piano nas noites parisienses, onde fazia bastante sucesso; ele compôs a música para o seu Balé Mecânico para dez pianos, campainhas e serras elétricas, buzinas de automóveis e xilofones. Antheil compôs a música para o filme Retorno à Razão [Retour à la Raison], de Man Ray, exibido na mostra Surrealismo, Cinema e vídeo, realizada no CCBB (Rio de Janeiro, 2001). De volta aos Estados Unidos, Antheil viveu em Hollywood (1936-).

Como estudante de música o grego Yannis Xenakis (1922-) foi discípulo de Arthur Honneger, Darius Milhaud e de Olivier Messiaen; como arquiteto, ele tornou-se assistente de Le Corbusier (Paris). Xenakis ficou mais conhecido como músico do que como arquiteto, por ter sido um dos primeiros que superou a música serial, a eletrônica e a música concreta [musique concrète], para, na década de 1950, mergulhar na música composta em parceria com os primeiros computadores. O artista possuía profundos conhecimentos matemáticos, que fizeram-no aderir às composições executadas com o auxílio de um computador, no qual ele inseriu dados que deram a partida para suas inusitadas composições. Xenakis compôs para orquestra Metastasis (1954), Phitoprakta (1956) e Achorripsis (1957); e, para meios concretos e eletrônicos, o Concerto PH, Diamorfosis e Analógica A + B. Uma de suas mais surpreendentes composições foi Estratégias (1963), música composta para dois maestros e duas orquestras, que competiam no combate frontal, com golpes que eram fragmentos musicais, enquanto que um computador servia de árbitro. No caso de suas inovadoras composições, Xenakis buscou, acima de tudo, a liberdade: nelas ele utilizou a aliança de vários instrumentos, que concorreram em prol do desenvolvimento espacial de sua música. A estratégia possibilitou ao músico alçar voo em busca de ilimitadas perspectivas inovadoras, nas quais, sem dúvida, a indeterminação e o acaso desempenharam o seu papel. A trajetória concreta e eletrônica marcou, através do estudo da escala sonora, a composição Metastasis: nela, o compositor se rebelou contra a construção linear da música serial, e resolveu, de modo matemático, o problema da distribuição das alturas musicais na totalidade do espaço físico.

REFERÊNCIAS SELECIONADAS:

ARTIGO. MARTINS, S. 100 Anos de Dissonância. São Paulo: Veja, 1º Abr., 2009, pp. 120-123.

CATÁLOGO. ADES, D. Dada and Surrealism Reviewed. Introduction by David Syilvester and supplementary essay by Elizabetn Cowling. London: the Authors and the Art Council of Great Britain, Hayward Galleries, 1978. 475p.: il., pp. 127-129.

BEHAR, H. Sobre el Teatro Dada y Surrealista. Barcelona: Barral Editores, 1970, pp. 79-81.

DORY, K.; LEVINE, B. M. Music of Latin American Masters: Silvestre Revueltas: Redes, Sensemayá. Julian Orbon, Concerto Grosso for String Quartet and Orchestra. Alberto Ginastera, Pampeana n. 3.   Simon Bolivar Synmphony Orchestra of Venezuela: Eduardo Mata, Conductor, Cuarteto Latinoamericano. (v. catálogo Dorian Records, n. DOR-90178, recorded at Aula Magna of the University Central de Venezuela, Caracas, Nov., 1992). 

DUFOURCQ, N. (Org.); ALAIN, O.; ANDRAL, M.: BAINES, A.; BIRKNER, G.; BRIDGMAN, N.; Mme. de CHAMBURE; CHARNASSÉ, H.; CORBIN, S.; AZEVEDO, L. H. C. de; DESAUTELS, A.; DEVOTO, D.; DUFOURQ, N.; FERCHAULT, G.: GAGNEPAIN, B.; GAUTHIER, A.; GÉRARD, Y. HALBREICH, H.; HELFFER, M.; HODEIR, A.; ROSTILAV, M.; HOFMANN, Z.; MACHABEY, A.; MARCEL-DUBOIS, C.; MILLIOT, S.; MONICHON, P.; RAUGEL, F.; RICCI, J.; ROUBERT, F.; ROSTAND, C.; ROUGET, G.; SANVOISIN, M.; SARTORI, C. SHILOAH, A.; STRICKER, R.: TOURTE, R.; TRAN VAN KHÊ, A. V., VERLET, C. VERNILLAT, F.; WIRSTA, A.; ZENATTI, A.  La Música: Los Hombres, Los Instrumentos, Las Obras. Barcelona: Planeta, 1976, pp. 180, 185, 303, 325, 355, 359, 364, 365, 369, 373, 378.
 
HAGER, B. Les Ballets Suedois. Translated by Ruth Sharman. London: Thames and Hudson, 1990. 303p.: il., algumas color., p. 299,

MORAES, J J. Música da Modernidade. Origens da música de nosso tempo. São Paulo: Editora Brasiliense, 1983, pp. 115-122.

PIERRE, J. El futurismo y el dadaísmo. Madrid: Aguilar, 1968, p. 146..


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