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Monday, March 26, 2012

SÉTIMA PARTE REFORMULADA DA HISTÓRIA DOS BALÉS RUSSOS [BALLETS RUSSES], DA CIA. TEATRAL SERGEI PAVLOVICH DIAGHILEV (Paris, 1909-1929).


Novos balés para 1921.


O Bufão[Le Chout], cenários e figurinos de Pablo Picasso, música de Sergei Prokofiev; e Quadro Flamenco [Cuadro Flamenco], cenários e figurinos de Pablo Picasso, música de duas guitarras ciganas. O balé O Bufão estreou conjuntamente com Quadro Flamenco (17 de maio, 1921).

Na primavera, onde anualmente costumava apresentar seus balés, sempre com sucesso, Diaghilev arranjou curta temporada em Monte Carlo. A companhia voltou a re-encenar alguns espetáculos que estrearam anteriormente como A Sagração da Primavera (1913;v. biografias de Nicolai Roerich e de Igor Stravinski), agora apresentado com nova coreografia de Léonid Massine, que estreou com a presença de Igor Stravinski e foi dançado por Lidia Sokolova e Massine. Logo depois o coreógrafo e bailarino Massine foi demitido por Diaghilev, quando seu novo caso amoroso com uma bailarina chegou aos ouvidos do empresário russo. 

Diaghilev levou Bóris Kochno consigo para Madri, quando ele preparava os novos balés para a próxima temporada (1921). O empresário russo acabara de ser abandonado por seu amante de longa data, o bailarino e principal coreógrafo de sua companhia, Léonid Massine, que ele transformou em estrela de primeira grandeza. Diaghilev transferiu o principal papel do balé O Bufão [Le Chout], com música de Sergei Prokofiev e cenários e figurinos de Pablo Picasso, para o jovem bailarino Taddeusz Slavinski dançar.

Diaghilev resolveu aproveitar o encontro casual com grupo de bailarinos e músicos ciganos em Sevilha, para preparar o balé Quadro Flamenco [Cuadro Flamenco], com cenários e figurinos de Pablo Picasso e música de duas guitarras ciganas. Nesse ano a temporada parisiense realizou-se no pequeno teatro fora do circuito da moda: o Gaieté-Lyrique (Paris). O balé O Bufão estreou conjuntamente com Quadro Flamenco (17 de maio, 1921); pouco depois a companhia viajou para Londres, onde estreou os espetáculos da temporada no Teatro Prince [Prince's Theatre], pertencente ao empresário inglês C. B. Cochran.


Pouco depois Diaghilev embarcou em uma de suas mais estravagantes aventuras, quando encenou o balé clássico A Bela adormecida [The Sleeping Princess], com música de P. I. Tchaikowsky (v. Grupo dos Cinco). A experiente e competente coreógrafa Nijinska, foi convidada por Diaghilev para criar a coreografia para três novas danças do clássico A Bela Adormecida [La Belle en Bois Dormant]. Esse balé, que tinha sido encenado anteriormente na Rússia com a coreografia de Marius Petipa. foi programado para a segunda temporada londrina dos Ballets Russes, realizada no final do ano no Alhambra Theater (1921). O empresário inglês Oswald Stoll emprestou a S. P. Diaghilev L$ 10.000, o que não foi suficiente para cobrir os custos da produção do balé. Para a produção de A Bela Adormecida Diaghilev sabia que estava se arriscando em enorme empreitada, que afinal custou caríssimo à sua companhia.

O empresário contratou novos bailarinos: passaram a participar da companhia russa Olga Spessiva, Vera Trefilova, Lopokova e Lubov Egorova, bailarina que, posteriormente, foi professora de Tatiana Leskova, bailarina que organizou o corpo de baile do Theatro Municipal (Rio de Janeiro). Os novos bailarinos contratados foram Pierre Vladimirov, Anatole Vilzak, Nicolas Sergeiev e Taddeusz Idzikowski, que se tornaram grandes estrelas masculinas, e na temporada dançaram pela primeira vez nos palcos ocidentais.

Diaghilev queria que os cenários e figurinos para esse balé fossem desenhados por Alexandre Benois, artista pertencente ao Mundo da Arte [Mir Iskussstva] (v. nesse Blog, em Postagens Antigas), especializado no desenho de figurinos e encenações dos séculos XVII-XVIII. No entanto, Benois estava comprometido com outras produções russas: Diaghilev então contratou outro participante do mesmo grupo, Leon Bakst, que, mais tarde, foi considerado por muitos críticos como o mais destacado cenógrafo e figurinista de balé na primeira metade do século XX. O figurinista utilizou nas vestes profusão de plumas, bordados em ouro me prata e adereços luxuosos. O figurino da rainha foi de seda branca, ricamente bordado em azul e ouro, com leves toques verdes e levava a cauda de muitos metros de seda branca bordada em ouro e carregada por dois jovens pagens vestidos de seda branca com bordados nas mesmas cores. O Rei Negro vestiu roupa cor de laranja com ricos bordados texturizados em ouro, entre outros detalhes em relevo branco sobre saia negra, além de levar arranjo com profusão de plumas negras e douradas no ornamento da cabeça; a duquesa estava vestida toda em ouro com acentos negros e laranja e usava chapéu negro com plumas; enfim, os costumes desenhados foram deslumbrantes. Os luxuosos figurinos de Bakst para esta produção se encontram com vários de seus desenhos reproduzidos (SHEAD, 1989: 115-118).

Tudo foi muito dispendioso e Diaghilev resolveu estender o número de performances para cento e cinco apresentações: o balé estreou finalmente (Londres, 03 nov., 1921). Alguns dos espectadores gostaram do espetáculo e voltaram muitas vezes para apreciar a arte dos bailarinos, a beleza da coreografia, dos cenários e costumes. No entanto, o excessivo número de récitas no teatro com três mil lugares, fez com que os bailarinos se apresentassem para casa quase vazia: o balé fracassou. No final da programação O. Stoll confiscou os cenários e figurinos desse espetáculo, que nunca mais foi encenado completo pela companhia dos Ballets Russes. Essa foi a última tentativa de superprodução de balé clássico: Diaghilev voltou-se depois para a produção de espetáculos menores, modernos e bem mais ousados.

As finanças da companhia ficaram bastante combalidas: os anos da Primeira Guerra Mundial (1914-1918), prejudicaram a montagem dos espetáculos, pois os Ballets Russes não puderam se apresentar para o grande público nas temporadas dos grandes teatros, em Paris e Londres. O gênio de Diaghilev desejando manter vivo o sonho dos Balés Russos, conseguiu depois equilibrar as finanças abaladas de sua companhia. Na temporada parisiense que se seguiu à estréia londrina desse balé, foi apresentada a versão parcial e menor, de parte do balé A Bela Adormecida, agora rebatizado de As Bodas de Aurora, e que, ficou mais conhecido como Aurora, quando foram apresentadas três danças coreografadas por Nijinska. Devido ao confisco dos figurinos luxuosos de Bakst que estrearam em Londres, vários trajes de outros balés foram adaptados para essa produção'; foi reutilizado o cenário do balé O Pavilhão de Armide [Le Pavillon d´Armide], criado por Alexandre Benois para a primeira temporada parisiense dos Ballets Russes (1909; v, fotografias abaixo).
Os espetáculos apresentados na temporada foram produções anteriores, como Carnaval, com música de Schumann; e o grande sucesso da primeira temporada, trechos das Danças Polovetsianas do Príncipe Igor (Borodin), com cenários produzidos anteriormente, criações de Nicholai Roerich (v.). Diaghilev foi obrigado a reduzir o tamanho de sua companhia pois despediu vários bailarinos, mas fez questão de manter suas principais estrelas, Dubrowska, Egorova, Idzkowski, Kremnev, Nemtchinova, Schollar, Trefilova, Vladimirov e Vilzak, entre outros. Nessa ocasião Nijinska foi promovida a primeira coreógrafa-residente dos Ballets Russes.

A companhia de Diaghilev contratou cinco novos bailarinos, antigos alunos da escola de Nijinska; a companhia foi reduzida a somente trinta bailarinos. Anos antes, Igor Stravinski teve a idéia de produzir o libreto e a música para balé com tema de casamento campestre russo (1914-1917). O espetáculo As Núpcias [Les Noces], Cenas coreográficas russas com canto e música, recebeu cenários simples desenhados pela artista plástica russa Natália Gontcharova; e os costumes coloridos dos camponeses russos foram criados pela artista francesa Marie Laurencin. O exigente Diaghilev gostou de tudo o que foi produzido para esse espetáculo: ele ficou tocado pela música de Stravinski que foi-lhe dedicada, e apreciou os cenários e figurinos de Gontcharova, e a coreografia de Nijinska para esse espetáculo. O balé, que reviveu o espírito regional russo, estreou com a orquestra sob a regência do maestro suíço Ernest Ansermeet, com os pianistas George Auric, Francis Poulenc, Édouard Flament e Hélène Léon, quando Félia Dubrowska (A Noiva) e bailarinos dançaram na estréia do balé no Teatro Gaîeté-Lyrique (Paris, 13 jul., 1923). A critica teatral não aceitou bem esse balé moderno, mas o público fez do espetáculo grande sucesso dos Ballets Russes.

Diaghilev organizou a mistura de vários espetáculos, apresentando quatro novos balés e quatro óperas, na apresentação nessa mesma temporada em Monte Carlo, A música para os novos espetáculos foram encomendadas a Michel de Montclair, Francis Poulenc, Georges Auric e Darius Milhaud, os três últimos citados foram músicos franceses participantes do chamado Grupo dos Seis [Groupe des Six] (v. postagens no Blog: http://arteeuropeiadevanguarda.blogspot.com/)

A companhia contratou dois novos profissionais: a bailarina francesa Ninette de Valois (Edris Stannus) e o inglês Anton Dolin (Patrick Healey-Kay). Dolin, nova paixão de Diaghilev, se transformou em uma das maiores estrelas dos palcos internacionais; todos os quatro novos espetáculos foram coreografados por Nijinska.

O primeiro balé apresentado foi As Tentações da Pastorinha [Les Tentations de la Bergère], evocação pastoral da côrte de Luís XIV com música adaptada do francês Michel de Monteclair, libreto de Bóris Kochno com cenários e figurinos de Juan Gris, quando Nemtichinova, Slavinski, Vilzak e Woizikovski dançaram a coreografia de Nijinska na estréia desse espetáculo (Monte Carlo, 03 jan., 1924). Não fez sucesso, e o balé logo desapareceu do repertório da companhia.

O segundo balé foi Os Bichos [Les Biches], com música de Francis Poulenc, cenários e figurinos de Marie Laurencin pintados pelo Príncipe Schervashidze e costumes realizados por Vera Sudeikina, que se tornou depois de enviuvar, a segunda esposa do músico Igor Stravinski. Essa foi primeira música que Diaghilev encomendou a Poulenc, que permitiu-lhe a criação de balé atmosférico na melhor tradição de As Silfides [Les Sylphides] (Chopin/ Stravinski). Esse espetáculo deixava no ar ambiguidades, devido ao ineditismo do tema do homossexualismo, apenas sugerido, insinuado, razão maior do seu grande sucesso. Poulenc compôs a música para orquestra com 50-60 músicos e acrescentou doze cantores, que poderiam também ser em maior número para o caso da apresentação se realizar em teatro maior. O coro assim formado cantou os dois números das ditas, Canções Dançadas [Chansons Dansées], com a Dança Grupal, dita, Jogo [Jeu]. As palavras das canções foram de autoria de Poulenc, todas baseadas nos cantos da tradição popular francesa, mas que não estabeleceram grandes vínculos com o espetáculo encenado no palco. A música de Poulenc foi adequada ao balé: atmosférica, misteriosa, camaleônica, sentimental e jazzística, que se mostrou influenciada por composições de Stravinski e Mozart, mas foi, na essência Poulenc. Dedicada a Misia Sert (v. biografia nas postagens do Blog: http://arteeuropeiadevanguarda.blogspot.com/), pianista, jovem de sociedade e patrocinadora da companhia russa, que se interessou vivamente por todos os aspectos visuais desse balé. Os maestros foram Édouard Flament (Monte Carlo) e André Messager (Paris). Nijinska também dançou nesse espetáculo na companhia de Vera Nemtchinova, mais tarde substituída pela bailarina Lidia Sokolova, pares dos bailarinos Anatole Vilzak, Leon Woizikovski e Nicolas Zverev. O balé Os Bichos [Les Biches] representou a mais perfeita síntese da interação de todos os aspectos de espetáculo de balé, desde a música, o desenho dos cenários e figurinos, a coreografia das danças e se mostrou completamente atual quando foi reencenado, décadas depois, no palco londrino (1924; 1964).

A coreografia de Nijinska para esse balé foi baseada nas coreografias clássicas russas, sendo essa obra considerada como sua melhor referência. O balé foi reencenado na temporada do Balé Real [Royal Ballet] (Londres, 1964), com Svetlana Beriosova e Georgiana Parkinson como pares de Robert Mead e Keith Bosson, cujas fotografias se encontram reproduzidas (SHEAD, 1989: 130-131).

Bóris Kochno, o novo acessor de Diaghilev, apresentou ao empresário russo a idéia original, que levou-o a montar o balé Os Entediados [Les Fâcheux], nome e argumento derivado de comédia de Molière, com música de Georges Auric (v. Grupo dos Seis músicos franceses), com cenários e figurinos de Georges Braque. Cômico, no mesmo espírito das comédias populares de Molière, Bóris Kochno escreveu o libreto para a música de Georges Auric. Nesse espetáculo o amante que se dirige ao encontro amoroso no quadrilátero com correr de casas do século XIX com as cores carregadas nos ocres e verdes, foi retardado pelos ditos, entediados: o jogador de cartas, vários fofoqueiros, no local onde pessoas praticavam esportes ou jogos. Os dançarinos principais foram Lubov Tchernicheva e Anatole Vilzak; o inglês Anton Dolin dançou com os pés em ponta, na coreografia de Nijinska criada especialmente para destacá-lo como estrela da dança. O balé, cujos personagens atuaram com mímica e acrobacias, não fez sucesso junto ao público: a curta temporada de apenas doze récitas foi realizada no Teatro dos Champs Elysées (Paris, 12 maio, 1924).

Para o quarto e último balé dessa temporada, Diaghilev encomendou a música a Darius Milhaud, algo no espírito das operetas de Offenbach, ligeira e frívola. Milhaud compôs a música perfeita para o balé O Trem Azul [Le Train Bleu], descrito como Opereta dançada de Jean Cocteau [Operette dansée de Jean Cocteau]. O cenário praiano foi de Henri Laurens, a cortina foi pintada por Pablo Picasso e os magistrais figurinos esportivos foram criados e confecionados por Mlle. Chanel. Esse balé foi espetáculo completamente diferente dos balés até então apresentados nos palcos europeus, entre os grandes sucessos dos Ballets Russes.

Na estréia, o maestro foi André Messager e os bailarinos que dançaram a coreografia de Nijinska foram a própria coreógrafa com Lidia Sokolova, Anton Dolin e Léon Woizikovski, com vinte bailarinos em cena. O balé se passava na praia e apresentou vários esportistas, bailarinos vestindo camisetas e shorts de malha listrada, usando figurinos modernissimos de Chanel. O cenário praiano mostrava casais namorando, outros tomando banho de mar, brincando e jogando, em clima agradável, no balé leve, divertido e completamente inusitado. No balé O Trem Azul, Anton Dolin dançou e realizou inúmeras piruetas e acrobacias no palco, nesse espetáculo que levou-o ao estrelato internacional; pouco tempo depois, quando o bailarino deixou a companhia de S. Diaghilev para voltar a viver na Inglaterra, o balé foi descartado do repertório dos Ballets Russes, pois nenhum bailarino se equiparava e realizava essa apresentação com a graça e a habilidade da arte do inglês. A temporada bem sucedida levou os quatro novos espetáculos de balé se apresentarem na Alemanha no outono; os balés estrearam no final do ano na temporada londrina, no Teatro Coliseum (24 nov., 1924), quando foi recebido com grande entusiasmo pelo público inglês.


REFERÊNCIAS  SELECIONADAS:

CATÁLOGO. ATTI, F. C. degli; FERRETTI, D. (Org.). Rusia, 1900-1930, L'Arte della Scenna. Milano: Galeria Electa. Moscou: Museu Bachrusín, 1990,  pp. 115-118, 251.

SHEAD, R. Ballets Russes. Secaucus, New Jersey: Quarto Book, Wellfleet Press, 1989.192p.: Il,.algumas color., 25 x 33 cm, pp. 38, 58-59, 113, 120, 122-124, 126, 127-128, 130, 132, 137, 138, 142, 167.

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